OBJETIVOS DO BLOGUE

Olá, bem-vindo ao blog "Chaves para a Sabedoria". A página objetiva compartilhar mensagens que venham a auxiliar o ser humano na sua caminhada espiritual. Os escritos contém informações que visam fornecer elementos para expandir o conhecimento individual, mostrando a visão de mestres e sábios, cada um com a sua verdade e experiência. Salientando que a busca pela verdade é feita mediante experiências próprias, servindo as publicações para reflexões e como norte e inspiração na busca da Bem-aventurança. O blog será atualizado com postagens de textos extraídos de obras sobre o tema proposto. Não defendemos nenhuma religião em especial, mas, sim, a religiosidade e a evolução do homem pela espiritualidade. A página é de todos, naveguem a vontade. Paz, luz, amor e sabedoria.

Osmar Lima de Amorim


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quinta-feira, 10 de novembro de 2022

ACEITAÇÃO E MUDANÇA

"Aceitar as coisas 'como elas são 'é um dos argumentos fundamentais de Eckhart Tolle na obra O Poder do Agora. Essa receita, que parece nos convidar ao imobilismo, é, por sinal, frequentemente citada como uma das causas do estado de pobreza do povo indiano, embora lá se apresente também um dos mais baixos índices de criminalidade. O teósofo C. Jinarajadasa aborda esse paradoxo em um de seus textos, ressaltando a profunda diferença entre o pensamento indiano e o ocidental, em face dos reveses da vida.

Marcado pela cultura hinduísta, o indiano típico não procura racionalizar a causa de seu desconforto, segundo Jinarajadasa. Diante de um resfriado, provavelmente não dirá, como um europeu ou americano, 'peguei esse resfriado porque tomei chuva ontem'. Para ele tudo é fruto: do karma, de uma sucessão de causas e efeitos cujo início pode até mesmo estar muito longe daquele momento específico. Em face disso, ele apenas aceitará em seu 'agora' o fato de estar resfriado, ou seja, aquilo que 'é'.

O relato de Jinaradasa nos leva a pensar que, se o indivíduo não atentou para a provável causa do resfriado, será levado a repetir o problema. Mas o que ocorre quando pensamos saber a causa de um problema e o repetimos sempre - como é bastante comum?

Primeiramente temos que analisar o sentido daquilo que 'é', segundo Tolle, e isso corresponde ao fato que se encontra diante de nós. O que é um fato? É tudo o que nos rodeia, independentemente de julgamentos, e também o que surge em nosso corpo neste momento: perturbação, doença, fadiga. São ocorrências do mundo fenomênico, tratadas como a Grande Ilusão (Maya) na filosofia hindu, em virtude de sua impermanência.

Podemos negar a impermanência de tudo o que vivemos agora, seja em matéria de saúde, bens materiais ou relações afetivas? Tudo isso vai mudar, vai passar, dentro em pouco ou no máximo em alguns anos; no entanto, em nosso mundo de inconsciência nós agimos como se fosse durar para sempre. Nossa ânsia de prolongar o prazer ou evitar a dor nos faz correr atrás de alguma mágica que possa apagar da nossa frente aquilo que 'é': a impermanência.

Apesar da impermanência de tudo, neste momento cada situação é um fato, e isso inclui os nossos limites pessoais. AÍ reside um dos maiores problemas de convivência: quando ignoramos nosso limite ou o limite alheio como um fato, dentro da natureza do agora, esperamos dos outros mais do que podem nos dar, e até mais do que temos o direito de pedir.

Ao nos sugerir a aceitação daquilo que 'é', Tolle não nega a validade de tentarmos mudar, buscando, por exemplo, o remédio para uma doença. Ele diz 'aceite', e depois, se for o caso, 'aja'. Qual é o efeito disso? Quando você aceita uma situação agradável ou desagradável apenas como um fato, não como algo a que se agarrar ou rejeitar de imediato, deixa de fazer o eterno jogo da polaridade prazer-dor, repetindo os problemas. Então surge à sua frente um outro fato: a escolha mais sábia e menos dolorosa possível, porque ela nasce agradável ou desagradável apenas como um fato, não como algo a que se agarrar ou rejeitar de imediato, deixa de fazer o eterno jogo da polaridade prazer-dor, repetindo os problemas. Então surge à sua frente um outro fato: a escolha mais sábia e menos dolorosa possível, porque ela nasce de seus canais espirituais, intuitivos, e não de sua mente, que é prisioneira da reatividade e do tempo.

Esse talvez seja o resultado da fé que produz milagres ou da resignação indiana - se é boa ou má, de fato não podemos avaliar. Em ambos os casos, porém, a implícita atitude de entrega deve abrir caminho para nosso Deus pessoal. Ele é livre do tempo e infinitamente mais capaz de fazer escolhas do que o intelecto, pois está em harmonia com a Vida Universal."

(Walter Barbosa - Aceitação e mudança - Revista Sophia Ano 19, nº 96 - p. 12/13)
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terça-feira, 13 de setembro de 2022

CURATIVOS DA ALMA

"Algumas dores podem ajudar a curar feridas da alma Os véus físicos não impedem que o invisível, de alguma forma, se manifeste. 

Sábios sugerem: cure sua mente e seu corpo ficará curado. Sua alma se sentirá mais livre para atuar e servir através do veículo físico. 

Tudo no universo é regido por leis eternas e imutáveis. Mesmo que não as conheçamos, elas atuam. Conhecer é o primeiro passo para a libertação. 

Dizem-nos para ter paciência e que 'o tempo de lá (no mundo 'espiritual) é diferente do tempo daqui.' Estamos imersos no Eterno e a mão divina nos acolhe sem restrições. 

O medo é inimigo do real. 

Pode surgir a pergunta: Depois de tanto tempo convivendo com você mesmo, o que de mais importante você aprendeu a seu respeito? Podemos tentar responder, sem crítica, sem controle, sem julgamento.

Por que existem tantas cercas à nossa volta? Qual o motivo e o sentido de tanta separatividade? As vezes é preciso aparecer um palhaço ou uma criança para revelar que o rei está nu. 

Vejam essa surpreendente e reveladora história que me contaram: uma criança chega ao Rio e, depois de caminhar por algumas ruas, pergunta: 

- Vovó, por que existem tantas prisões? 

- Como assim!? Reagiu a avó.

- Eh, vovó! Por que todas essas grades na frente das casas e dos edifícios.

A avó tomou um susto, respirou fundo, apertou a mãozinha do neto e o convidou a tomar um sorvete ali perto, protegidos pelo olhar vigilante do segurança da rua.

Existem as grades internas e as externas. Como retirar o cadeado das portas de nossa alma? Parte da cura pode depender desse nosso gesto.

Podemos.

Vamos!"

(Fernando Mansur - O Catador de Histórias - Ed. Teosófica, Brasília, 2018 - p. 91)
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terça-feira, 19 de julho de 2022

A ACEITAÇÃO DA NOSSA NATUREZA HUMANA IMPERFEITA

"Ser humano é ter defeitos e imperfeições. Todos nós cometemos erros, às vezes magoamos as pessoas que nos são mais próximas, e às vezes nos comportamos muito mal. No entanto, essa simples verdade parece-nos muito difícil de aceitar. 

Quando me conscientizo de que magoei minha filha por causa de um diálogo descuidado, eu me encolho por dentro, como que tentando me defender da dor que é parte inevitável da consciência de meus atos. Temos uma relutância ainda maior em aceitar as mensagens sobre os nossos defeitos vindas de outras pessoas. Imediatamente erguemos defesas, como se estivéssemos sendo fisicamente atacados. Na verdade, a reação fisiológica de defesa lutar/fugir, adequada a situções nas quais existe uma ameaça imediata de dano corporal direto, é usada para proteger a autoimagem idealizada, que precisa ter a aparênciade certa e boa, e não de errada e má. Esquivamo-nos de encarar nossos erros e defeitos porque eles são uma parte dolorosa, embora inevitável, de quem somos. Somente quando contenho o perfeccionismo é que consigo sentir a simples tristeza de ter magoado minha filha. Respiro profundamente afrouxo as defesas automáticas e sinto a simples dor. Somente assim consigo perdoar. Atinjo um nível mais profundo de autoaceitação.

Quando negamos nossos defeitos, nosso egoísmo, ficamos enredados na tentativa de parecer melhores do que somos e afastar a culpa pelas nossas dificuldades. 'Não foi culpa minha' é a primeira coisa que a criança em nós grita sempre que confrontamos com nossos erros. Quando acontece alguma coisa desagradável, respondemos internamente como a criancinha que ouve a voz da mãe chamando por ela depois que um terremoto abalou a casa. Sua primeira resposta é: 'Não fui eu, mamãe.' A criança dentro de nós tem medo de reconhecer que possuir qualidades más ou imperfeitas signifiquem que ela é unicamente má, ou que, sendo tremendamente má, ela será julgada ou rejeitada pelos 'outros' pais que, imaginamos, são responsáveis pelo nosso bem-estar. 

Por medo do eu imperfeito, criamos um eu máscara, um eu idealizado, o eu que pensamos que deveríamos ser, em vez de admitir que somos seres humanos imperfeitos. Todos nós respondemos prontamente 'vou bem' quando nos cumprimentam, por maior que seja a nossa depressão, por causa da crítica que o chefe acabou de nos fazer, ou a alegria por um recente sucesso profissional. Asseguramos prontamente a nós mesmos e aos outros que 'eu estou bem, sou competente, posso dar um jeito', por maiores que sejam a carência ou a infelicidade verdadeiras. Fui uma criança de desempenho acima do normal, ansiosa por parecer sempre inteligente e competente, conquistar o amor e garantir a aprovação de meu pai. Essa máscara continua aparecendo na adulta que sou sempre que me vejo 'agindo corretamente' e, portando, sendo melhor que os outros; por exemplo, quando cato o lixo que os outros jogam na estrada. 

Seja qual for a máscara criada - o bom menino, a boa menina, a mulher ou o homem poderoso, o aluno aplicado ou o professor confiante, a criança carente ou o adulto competente, o pesquisador ingênuo ou o cético experiente - ela é uma tentativa de nos colocarmos num plano acima dos defeitos e da dor, de negar nossa mediocridade e pequenez. Criamos uma máscara sempre que tentamos nos apresentar como pessoa mais amorosa ou poderosa, mais competentes ou carentes, mais compassivas ou céticas do que realmente somos naquele momento.

A fuga à experiência verdadeira do momento representa um enorme desperdício de energia que pode ser recuperada pelo simples ato de decidir aceitar-nos como realmente somos, em cada momento. Essa autoaceitação implica a compreensão da necessidade da máscara, criada para que a criança dentro de nós pudesse formar uma persona aceitável quando a autoestima parecia estar frágil ou ameaçada. 

À medida que aprofundamos o compromisso de ser honestos com nós mesmos e com os outros, criamos uma base mais sólida para a autoestima. Fazer um bom conceito de si mesmo passa a não depender mais de atender às exigências irrealistas de uma máscara perfeccionista; ao contrário, seu fundamento é a coragem de encarar a realidade humana imperfeita atual. O imenso potencial humano que temos só pode ser realmente nosso depois que ousamos ser exatamente e exclusivamente quem somos em cada momento, por mais mesquinha ou assustadora, grandiosa ou sagrada que seja a realidade temporária.

'Se você não aspirar a ser mais do que é, jamais ousará ser tudo o que você é.' Essas palavras, que me foram ditas há anos pelo Guia do Pathwork, continuam a me orientar."

(Susan Thesenga - O Eu Sem Defesas - Ed. Pensamento-Cultrix, São Paulo, 2015 - p. 25/26)
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quinta-feira, 14 de julho de 2022

COMO ENFRENTAR A DOR DOS PADRÕES DESTRUTIVOS - A MUDANÇA DA EVASÃO PARA A REALIDADE

"Porém, não acredite que essa pressão, essa frustração completa, não existia antes que você tomasse consciência dela. Ela existia, mas criou outras saídas, talvez na doença física ou em outros sintomas. À medida que você se dá conta do núcleo central, a pressão e a dor podem se tornar mais agudas, mas é assim que tem que ser o processo de cura. Você então dirige a sua consciência para a causa central, onde o problema realmente reside. Você focaliza a sua atençao sobre a raiz. Você troca a sua ênfase da evasão para a realidade. A verdadeira dor tem que ser experimentada em todos os seus tons e variedades. Você tem que se dar conta de que as suas necessidades são exatamente ambos, dar e receber. Você precisa sentir e observar a frustração de não encontrar uma válvula de escape, a pressão acumulada, o sentimento momentâneio da desesperança quanto a encontrar alívio; a tentação de fugir uma vez mais. À medida que você batalha através dessa fase e fica mais forte, você não foge mais de si mesmo e do risco aparente de viver. Oportunidades surgirão no seu caminho. Você as verá e fará uso delas. Elas lhe ensinarão a progredir no seu crescimento e na sua força até que as suas necessidades possam encontrar satisfação parcial, e então aumentá-la pouco a pouco enquanto você cresce e muda os seus padrões.

Você precisa entender que nesse período você se encontra num estado transitório. Você se conscientizou da sua necessidade de receber, que é saudável em si mesma, mas essa necessidade tornou-se exageradamente forte e, portanto, imatura, por causa da sua repressão sobre ela e da consequente frustração da satisfação sadia de receber. Se você não recebe o bastante, sua demanda fica desproporcionada, especialmente quando você está inconsciente dessa exigência estrita. 

Devido ao seu progresso e ao crescimento que ocorreu dentro de você, a necessidade madura de dar também cresceu. Você pode não ter encontrado um escape para ela por causa dos padrões destrutivos que ainda estavam atuando; talvez apenas em parte, talves de forma modificada. Você pode até ter iniciado tentativas de um acordo entre o velho e o novo caminho, este último sendo o desejado. Porém, não esqueça que resultados efetivos só podem ocorrer quando os novos padrões se tornam uma reação integrante e quase automática em você. Seus velhos padrões têm existido por anos, por décadas, e com frequência por mais tempo. Agora, enquanto você aprende e começa a mudar interiormente, a mudança externa não chega imediatamente. Nesse período, a pressão interna pode se tornar mais forte ainda. Contudo, se você se apercebe de tudo isso e tem a coragem de enfrentá-lo, necessariamente virá a ser uma pessoa mais forte, mais feliz, mais bem equipada para viver no verdadeiro sentido da palavra. Tenha cuidade para não voltar à evasão. Não acredite que esse período temporário no qual você encontra toda a pressão interna acumulada, com o desamparo, a inadequação e a confusão que a acompanham, seja o resultado final. Ele é o túnel através do qual você tem de passar. 

Depois que o fizer, o seu senso de força, de adequação e o seu tirocínio vão crescer constantemente - com ocasionais recaídas, é claro. Mas se você fizer com que cada recaída se transforme em outro ponto de apoio, em mais uma lição, os novos padrões, com o tempo, irão firmar-se no seu Ser Interior, fazendo com que você veja as possibilidades que deixou de perceber por tanto tempo. Você então vai ter a coragem de se aproveitar dessas possibilidades, em vez de rejeitá-las por medo. Assim, e só assim, a satisfação virá. 

É tão importante para você entender isso, conscientizar-se disso. Se isso acontecer, as vantagens serão suas. (...)"

(Eva Pierrakos e Donovam Thesenga - Não Temas o Mal - Ed. Cultrix, São Paulo, 1993 - p. 113/115)
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terça-feira, 12 de julho de 2022

COMO ENFRENTAR A DOR DOS PADRÕES DESTRUTIVOS - A DOR DA INSATISFAÇÃO

"Agora, meu amigo, quando você se depara com essa dor, é ela realmente apenas a dor que você experimentou um dia quando criança? Será essa realmente a frustração que a criança sofreu por causa dos pais e nada mais? Não, isso não é inteiramente correto. É verdade que essa dor e essa frustração originais afetaram a flexibilidade da sua psique, sua capacidade de adaptação, e assim o tornaram incapaz de lidar com elas. Esses eventos fizeram com que você lhes virasse as costas e procurasse por 'soluções' insatisfatórias. Mas a dor que você experimenta agora é muito mais a dor presente da insatisfação, causada pelos seus padrões improdutivos. Você não pode distinguir isso conscientemente e não pode sequer ter consciência da dor infantil original. Pode ser preciso muito tempo e muita auto-observação para chegar mesmo a distinguir a dor. Depois que o fizer, você verá que a dor mais aguda é o seu desespero com a sua vida e com você mesmo agora, e não no passado. Este é importante somente porque ele fez com que você instituísse os modos improdutivos responsáveis pela sua dor atual.

Se você não fugir da dor, mas a enfrentar, passar por ela, tomando consciência do seu significado, você vai se dar conta de que as suas necessidades atuais não satisfeitas provocam a dor. Sua frustração será com a sua inviabilidade atual para produzir satisfação. Você ainda não é capaz de ver o que pode fazer a esse respeito, sentindo-se preso na sua própria armadilha, incapaz de enxergar a saída e, assim, ficando dependente de intervenção exterior, sobre a qual não tem nenhum controle. Só depois de ter corajosamente se tornado consciente de todas essas impressões e reações é que você gradualmente verá uma saída e, portanto, diminuirá o seu desamparo e aumentará a sua força independente e o seu tirocínio. 

Numa palestra anterior nós discutimos as necessidades humanas. Ante que você descubra as suas várias 'camadas protetoras', você não pode nem ao menos ter plena consciência das suas necessidades reais.Você pode conhecer algumas das suas necessidades irreais, superpostas, mas só após uma compreensão mais completa de si mesmo é que você se torna gradualmente consciente das  necessidades básicas, nuas, que você mantinha reprimidas. Quando você experimenta a dor antes de cruzar o limiar para a maturidade emocional e padrões produtivos, você tem a possibilidade, se assim escolher, de ficar precisamente consciente dessas necessidades. Isso é inevitável se você deseja sair do seu presente estado de viver improdutivo. 

A medida que passa pelo processo de tomada de consciência das suas necessidades e da frustração causada pela sua insatisfação, você descobrirá primeira a imperiosa necessidade de ser amado exatamente como a crinaça precisa receber amor e afeição. Contudo, não se pode dizer que a necessidade de ser amado é infantil e imatura. Só é assim que a pessoa adulta trancou a sua alma e se recusou a crescer em sua própria capacidade de dar amor, de forma que a necessidade de receber permanece isolada e também encoberta. Através dos seus padrões destrutivos você empurrou a sua dolorosa necessidade de receber amor para o inconsciente. Devido a essa falta de consciência e aos seu mecanismos de defesa de várias espécies, a sua capacidade de dar jamais pôde crescer no interior da sua psique. 

Todavia, durante todo o trabalho que temos feito, você não apenas se tornou consciente de tudo isso que estava oculto, mas, como eu disse antes, você começou a dissolver certos níveis nefastos. Isso, como que inadvertidamente, fez com que a sua capacidade de dar amor emergisse, mesmo que você não possa ainda se dar conta disso, de forma completa. Ao encontrar a dor, você realmente experimenta a tremenda pressão das suas necessidades. Por um lado, você encara a necessidade de receber, que continua insatisfeita enquanto os padrões destrutivos prevalecem. É preciso algum tempo para conseguir a força necessária e o tirocínio requerido para produzir a satisfação da necessidade de receber. Por outro lado, a necessidade de dar não pode encontrar um escoadouro até que esse estágio seja atingido. Assim, uma dupla frustração é causada - e isso gera uma tremenda pressão. É uma pressão que é tão dolorosa. Ela parece parti-lo em pedaços." ... continua.

(Eva Pierrakos e Donovam Thesenga - Não Temas o Mal - Ed. Cultrix, São Paulo, 1993 - p. 111/113)
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quinta-feira, 7 de julho de 2022

COMO ENFRENTAR A DOR DOS PADRÕES DESTRUTIVOS - A DOR DA MUDANÇA

"Você poderia esperar, ao atravessar esse importante limiar, que os padrões novos e construtivos pudessem substituir imediatamente os antigos padrões destrutivos. Tal expectativa não é realista e não corresponde à verdade. Os padrões construtivos não podem ter uma base sólida antes que você experimente e atravesse a dor e a frustração originais e tudo aquilo do que você fugia. Essa coisa à qual você virou a face tem que ser encarada, sentida, experimentada, compreendida. Você tem que lidar com ela, tem de chegar a um acordo e assimilá-la antes que o que é doentio e não realista seja dissolvido, antes que o que é imaturo amadureça e que as forças sadias, mas reprimidas, sejam trazidas para os seus canais próprios de forma que operem de maneira construtiva para você. Quanto mais você adia esse doloroso processo, mas difícil e demorado ele será quando você finalmente estiver pronto para passar da infância para a idade adulta. A dor desse processo é uma dor saudável de crescimento e a luz estará à vista se e quando você superar a sua resistência a ele. A força, a autoconfiança e a capacidade de viver integralmente, com todos os seus padrões construtivos começando a funcionar, constituem ampla compensação por todos os anos de vida destrutiva e improdutiva, bem como pela dor de atravessar o portal para a maturidade emocional. 

Você pode imaginar-se sendo poupado da experiência da dor contra a qual você instituiu os padrões destrutivos? Você os utilizou para fugir de algo que ocorreu na sua vida, e o fato de isso ser real ou imaginário faz pouca diferença. Foi o processo fantasioso de fugir e voltar as costas algo que existe ou existiu, não encarando, portanto, a sua realidade nem lidando com ela, que causou a doença da sua alma. Por conseguinte é essa área que tem que ser tratada agora. É por isso que aqueles dentre vocês que deram os seus primeiros passos hesitantes do limiar estão confusos pela dor da experiência . Com frequência você não compreende inteiramente porque isso ocorre; você pode ter uma vaga ideia e algumas respostas parciais, mas esta palestra vai ajudá-lo a conseguir um entendimento mais profundo da razão pela qual isso acontece.

Intelectualmente todos vocês sabem que este Pathwork não é um conto de fadas no qual a pessoa descobre os seus desvios, suas concepções errôneas e evasões e, depois de ter feito isso, aguarda-o, naturalmente, nada além de uma grande felicidade. É verdade, naturalmente, que, em última análise, a libertação dos grilhões de erro e de desvio necessariamente lhe trará a felicidade, mas até que você alcance esse estágio, muitas áreas de sua alma têm que ser experimentadas até que a sua psique esteja realmente preparada para obter o melhor da vida. Mesmo depois de a dor aguda ter recebido o tratamento adequado, não estando, portanto, mais presente, existirá a expectativa irreal, embora com frequência incosciente, de que a vida a partir de então sempre irá garantir aquilo que você deseja. Não, meus amigos. Todavia, a realidade é muito melhor. Na verdade, você vai aprender a enfrentar os reveses e as dificuldades, em vez de ser arrastado por eles. Você não irá fortalecer as suas defesas destrutivas. Isso, por sua vez, vai equipá-lo com os instrumentos para tirar o melhor de cada oportunidade e para obter o máximo benefício e a maior felicidade de cada experiência da vida.

É necessário dizer que isso jamais é conseguido com os seus mecanismos de defesa destrutivos e com suas várias imagens. Deixe-me repetir aqui o que tenho dito com frequência: a princípio, os eventos negativos externos vão continuar a cruzar o seu caminho, como resultado dos seus arraigados padrões do passado, mas você vai encará-los de maneira diferente. À medida que aprende a fazê-lo, você se torna consciente de muitas oportunidades de felicidade que você ignorou no passado. Dessa maneira, você começa a modificar os seu padrões até que muito, muito gradualmente os eventos externos infelizes cessam. Mas enquanto você se encontrar no início desse estágio, não espere satisfação e felicidade imediatas em cada aspecto. Primeiro você precisa ver as suas possibilidades e oportunidades e a sua capacidade independente de escolha, em vez de ficar totalmente indefeso à espera que o destino lhe traga felicidade. 

A essa altura, você deve compreender como, em muitos aspectos, causou a sua própria infelicidade por meio de suas próprias evasões e defesas, destrutivas e divorciadas da realidade. Você perceberá agora, com um novo senso de força, como pode criar a sua própria satisfação e felicidade. Da mesma forma que antes, isso não pode ser feito por meio da compreensão intelectual. É um processos interior que cresce organicamente. Assim como você, agora, compreende em profundidade que nenhum destino ou Deus cruel o puniu ou negligenciou, da mesma maneira irá entender e saber que, na verdade, é você que pode criar toda a satisfação qua sua alma deseja como um anseio do qual você nem ao menos tinha consciência quando iniciou este Pathwork. 

Essa consciência só pode emergir depois de uma compreensão mais completa de todas as suas falsas soluções e concepções errôneas, cujas pro.fundezas o farão consciente das suas necessidades. O resultado primordial deste Pathwork é o entendimento de seu próprio sistema de causas e efeitos e o senso de força, independência, autoconfiança e justiça que essa compreensão dá a um indivíduo. Quanto tempo leva para atingir os primórdios hesitantes dessa força e para, mais tarde, aumentá-la depende dos seus esforços, da sua vontade interior e da sua superação da sempre presente resistência, a qual se desgasta apenas depois que você obtém considerável reconhecimento dos seus caminhos tortuosos." ... continua.

(Eva Pierrakos e Donovam Thesenga - Não Temas o Mal - Ed. Cultrix, São Paulo, 1993 - p. 109/111)
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terça-feira, 5 de julho de 2022

COMO ENFRENTAR A DOR DOS PADRÕES DESTRUTIVOS - A DOR DAS FALSAS SOLUÇÕES

"Quando a sua solução falsa é uma negação do sentimento, do amor e da vida, ela é uma defesa contra a possibilidade de ser ferido. Somente depois de uma visão considerável de si mesmo é que você se dará conta de quão irreal e limitado é esse 'remédio'. Você vai querer mudar e vai preferir aceitar a dor à alienação de não sentir nada, ou muito pouco. Prosseguindo com o trabalho e atravessando corajosamenteos períodos temporários de desânimo e resistência, você vai chegar ao ponto no qual essa concha endurecida se quebra e você não está mais morto por dentro. 

A primeira reação, porém, não será agradável, nem pode ser. Todas as emoções negativas reprimidas, bem como a dor reprimida, a princípio virão para a consciência e então parecerá que você estava certa ao reprimi-las. Só depois de prosseguir com o trabalho é que você obterá a recompensa, sob a forma de sentimentos bons e construtivos. 

Se a sua solução falsa é a submissão, a fraqueza, o desamparo e a dependência como meios de conseguir os cuidados de alguém - não necessariamente no âmbito material, mas emocionalmente - essa é igualmente uma solução limitada e insatisfatória. A dependência constante de outras pessoas cria medo e desamparo. Ela aumenta ainda mais a sua falta de confiança em si mesmo. Enquanto a solução do retraimento fez de você um morto quanto aos sentimentos, privando-o do significado maior da vida, a solução da submissão rouba de você a independência e a força, e cria não menos isolamento que o retraimento, embora o faça através de um caminho interno diferente. Originalmente, você queria evitar a dor munindo-se de uma pessoa forte para cuidar de você. Na realidade você inflige mais dor sobre si mesmo porque não é possível encontrar essa pessoa. Essa pessoa tem que ser você mesmo. 

Ao fazer-se deliberadamente de fraco, você exerce a mais forte das tiranias sobre os outros. Não existe tirania mais forte que aquela que uma pessoa fraca exerce sobre os mais fortes, ou sobre todo o seu ambiente. É como se essa pessoa estivesse sempre dizendo: 'Sou tão fraca! Você tem de me ajudar. Sou tâo indefesa! Você é responsável por mim. Os erros que eu cometo não contam porque eu não sei fazer de outro modo. Eu não posso evitar. Você deve ser indulgente comigo todo o tempo e permitir que eu escape das consequências. Não se pode esperar que eu assuma total responsabilidade pelas minhas ações ou ausência delas, por meus pensamentos e sentimentos ou pela falta deles. Eu posso falhar porque sou fraco. Você é forte e portanto tem que compreender tudo. Você não pode falhar porque o seu fracasso iria me afetar.' A autoridade preguiçosa e auto-indulgente dos fracos impõe exigências estritas às outras criaturas. Isso se torna evidente se a expectativa não verbalizada e o significado das reações emocionais forem investigadas e então interpretadas sob a forma de pensamentos concisos.

É uma falácia pensar que a pessoa fraca é inofensiva e fere menos as outras pessoas que aquela que é agressiva e dominadora. Todas as falsas soluções trazem dor implícita à personalidade, assim como aos outros. Pelo retraimento, você rejeita os outros e retém o amor que quer dar a eles e que eles, por sua vez, querem receber de você. Pela submissão, você não ama, apenas espera ser amado. Você não vê que os outros também têm as suas vulnerabilidades, suas fraquezas e necessidades. Você rejeita por inteiro essa parte da natureza humana das outras pessoas e, assim, você as fere. Através da solução agressiva, você afasta as pessoas e as machuca abertamente com falsa superioridade. Em todos os casos, você fere os outros e, assim, inflige um ferida ainda maior em si mesmo. E essa ferida não pode deixar de trazer consequências. Portanto, as falsas soluções, destinadas a eliminar a dor original , apenas trazem consigo mais dor.  

Todas as falsas soluções são incorporadas à sua auto-imagem idealizada. Uma vez que a natureza da auto-imagem idealizada é o auto-engrandecimento, ela o separa dos outros. Uma vez que a natureza dela é a separação, ela isola você e o faz solitário, bem como a todos os que se relacionam com você. Visto que a sua natureza é falsidade e fingimento, ela o aliena de si mesmo, da vida e dos outros. Tudo isso deve inevitavelmente cusar-lhe dor, mágoa, frustração, insatisfação. Você escolhe uma saída para a dor e para a frustração, mas esse caminho provou ser não apenas inadequado, mas traz ainda mais daquilo que você queria evitar. Contudo, reconhecer claramente essa fato e juntar os elos dessa cadeia requer o trabalho ativo da pesquisa sincera de si mesmo.

O perfeccionismo que está tão profundamente arraigado em você e na sua auto-imagem idealizada torna impossível aceitar a si mesmo e aos outros, aceitar a vida na sua realidade, e você, portanto, é incapaz de lidar com ela e resolver tanto os seus próprios problemas quanto os problemas da vida. Isso faz com que você se abstenha da experiência de viver no seu verdadeiro sentido. 

Se você se tornou, pelo menos até um certo ponto, consciente de algumas das suas imagens, falsas soluções e da natureza da sua auto-imagem idealizada particular, talvez você tenha a esta altura um vislumbre da maneira pela qual você é alienado  de si mesmo e perfeccionista. Deu-se conta, portanto, da extensão do dano causado a você mesmo e aos outros. Você pode estar próximo do limiar que abre o caminho para uma nova vida interior, uma vida que contém a disposição emocional de abandonar todas as defesas. Caso ainda não tenha chegado até lá, você vai aproximar-se dessa fase muito em breve, desde que continue o seu trabalho com disposição interior.

O mero exercício de observar constantemente as próprias emoções e reações irreais e imaturas enfraquece o seu impacto e inicia um processo de dissolvê-las, por assim dizer, automaticamente. Quando uma certa dissolução tiver acontecido, a psique estará pronta para cruzar o limiar; mas o ato de cruzá-lo é doloroso no início." ... continua.  

(Eva Pierrakos e Donovam Thesenga - Não Temas o Mal - Ed. Cultrix, São Paulo, 1993 - p. 107/109)
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quinta-feira, 30 de junho de 2022

COMO ENFRENTAR A DOR DOS PADRÕES DESTRUTIVOS

"(...) A criança sofre com certas imperfeições do amor e da afeição dos pais. Sofre também por não ser integralmente aceita em sua própria individualidade. Com isso eu quero me referir à prática comum de tratar uma criança como uma criança  antes que como um indivíduo em particular. Você sofre com isso, embora talvez nunca tenha tido consciência desse fato nestes termos ou em pensamentos exatos. Isso pode deixar uma cicatriz tão profunda quanto a falta de amor e atenção. A prática a que me refiro provoca tanta frustração quanto a falta de amor ou até mesmo a crueldade. 

O clima geral no qual você cresce o afeta como um choque pequeno mas constante, que frequentemente deixa uma marca mais forte que uma única experiência chocante e traumática. É por isso que esta última é geralmente mais fácil de curar que a primeira. O clima constante de não aceitação da sua individualidade, bem como a falta de amor e compreensão, causa aquilo a que se chama neurose. Você aceita esse clima como algo inevitável. Ele simplesmente está lá e você acredita que tem que ser assim. Todavia, você sofre com ele. A combinação do sofrimento causado por esse clima e da crença de que ele é inalterável condiciona-o a desenvolver defesas destrutivas. 

A dor e a frustração originais com as quais a criança não podia lidar são reprimidas. São retiradas da esfera da consciência, mas ardem na mente inconsciente. É então que as imagens e os mecanismos de defesa destrutivos começam a se formar. As imagens que você cria são mecanismos de defesa. Através das suas conclusões errôneas você busca uma maneira de lutar contra as influências indesejáveis que criaram a dor original. As falsas soluções são um meio de lutar contra o mundo, contra a dor e tudo o mais que você quer evitar." ... continua.

(Eva Pierrakos e Donovam Thesenga - Não Temas o Mal - Ed. Cultrix, São Paulo, 1993 - p. 106/107)
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terça-feira, 28 de junho de 2022

MANTENDO O CORAÇÃO ABERTO

"Não espere resultados imediatos ou milagres. Pode ser que só consiga aliviar o seu sofrimento depois de algum tempo, ou mesmo muito depois, quando você menos esperar. Não tenha qualquer expectativa de que isso vá 'funcionar' ou que acabe com seu sofrimento de uma vez por todas. Esteja tão aberto para a sua dor quanto está na sua prática, para os seres iluminados e para os budas.

Você pode até vir a se sentir misteriosamente grato ao seu sofrimento, porque ele lhe dá uma oportunidade de trabalhar com você mesmo e de transformar-se. Sem ele você nunca teria tido a possibilidade de descobrir que há, escondido na natureza e na profundidade do sofrimento, um tesouro de felicidade. Os períodos de sofrimento na sua vida podem ser aqueles em que está mais aberto; o ponto em que é mais vulnerável pode ser realmente o de sua maior força. 

Assim, diga para si mesmo: 'Não vou fugir desse sofrimento. Quero usá-lo da melhor e mais enriquecedora maneira que puder, de modo a poder tornar-me mais compassivo e mais útil aos outros'. O sofrimento, além de tudo, pode ensinar-me sobre a compaixão. Se você sofre, saberá como é quando outros sofrem. E se está na posição de poder ajudar os outros, é através de seu sofrimento que encontrará a compreensão e a compaixão necessárias para isso. 

Portanto, não importa o que faça, não recuse sua dor; aceite-a e permaneça vulnerável. Por mais desesperado que se sinta, aceite sua dor como ela é, porque de fato ela lhe está oferecendo um presente que não tem preço: a oportunidade de descobrir, através da prática espiritual, o que está além do sofrimento. 'A dor', escreveu Rumi, 'pode ser o jardim de compaixão'. Se voce mantém seu coração aberto para tudo, a dor pode tornar-se a sua maior aliada na busca do amor e da sabedoria. 

E já não estamos cansados de saber que proteger-se da dor não funciona? Que quando tentamos nos defender do sofrimento só sofremos mais e não aprendemos o que poderíamos com a experiência? Como Rilke escreveu, o coração protegido que 'nunca se expôs à perda, inocente e seguro, não pode conhecer a ternura. Somente um coração perdido e resgatado pode ceder ao contentamento: livre, por tudo que deixou para trás, para se alegrar em sua maestria'."

(Sogyal Rinpoche - O Livro Tibetano do Viver e do Morrer - Ed. Talento/Ed. Palas Athena, 1999 - p. 396/397
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quinta-feira, 13 de janeiro de 2022

COMPAIXÃO PARA UMA VIDA MELHOR

"Nós fazemos o melhor possível para viver num mundo baseado em gentileza e compaixão. No entanto, às vezes, o que eu pessoalmente gostaria torna-se mais importante do que aquilo que é bom para a comunidade.

Na religião, na filosofia, na ciência ou na política, onde quer que haja uma sociedade humana, ela manifesta sabedoria e compaixão. Porém, devido à nossa tendência ao egoísmo, a valorizar nossos gostos e aversões, nós nos isolamos dos outros. Não permitimos que a abertura entre seres humanos se expresse por causa de duas coisas fundamentais: esperança e medo. Todos nós queremos a felicidade e ninguém deseja sofrer. Assim, cada ação é motivada pela esperança de ser feliz e de evitar a dor; desenvolvemos uma atitude muito egoísta. 

Todas as filosofias e religiões do mundo almejam pôr abaixo a muralha do autoisolamento, para que possamos trabalhar uns com os outros com verdadeiro cuidado e compaixão. Do ponto de vista budista, examinamos a nós mesmos cuidadosamente - não para nos culpar por criar divisão, mas como um modo de trabalhar a principal causa do problema. 

O problema não está no mundo, ou nos outros, mas em nós. A sabedoria é inata em nós, mas nosso envolvimento com o ambiente e a distração de nossas emoções causa um obscurecimento que impede a auto-observação. Não nos damos tempo e espaço suficientes para usar nossa sabedoria e nos observamos antes de agir. 

No entanto, por meio da meditação ou da autoanálise, a sabedoria pode surgir no nosso interior. Meditação é um processo de olhar para dentro, de refrear a tendência dualista de prestar mais atenção às questões externas do que às internas, com as quais não queremos lidar.

Uma sociedade baseada na paz, na harmonia, na sabedoria e na compaixão não vai surgir a não ser que cada pessoa comece consigo mesma. Com nosso fracasso em usar a sabedoria inata, damos desculpas para não começar com nós mesmos. A maior desculpa é que precisamos que a outra pessoa mude primeiro. Se as coisas não acontecem de maneira como eu quero, a culpa é do outro. 

As percepções do mundo externo têm muito a ver com nossa atitude interior. A mente cria desculpas que refletem o que sentimos. Quando vemos uma pessoa e ela faz algo de que gostamos, então ela é uma boa pessoa. Mas se a mesma pessoa faz algo de que não gostamos, ela é uma pessoa ruim. Portanto, a transformação do mundo externo deve começar com a transformação interior. Somente quando o eu é subjugado, e quando uma boa percepção surge, é que temos força para nos relacionar da maneira apropriada com os outros.

O coração é basicamente bom, generoso e compassivo, mas não necessariamente atua com sabedoria. Temos muitas pessoas prontas para agir em prol de um mundo melhor, mas que ainda veem a filosofia, a religião e a política segundo o que elas gostam e querem. 

A realização da sabedoria interior em cada ser humano deve começar com o treinamento do eu. A ignorância não é algo que vem dos outros; ela vem da projeção do eu. Na filosofia budista falamos muito a respeito de ilusão - como a mente cria fenômenos externos que passamos a ver como sólidos e permanentes. Na meditação nós avaliamos a natureza onírica dos fenômenos externos. O primeiro passo é entender como surge a ilusão - como a mente atua para criar e solidificar o mundo. Se pudermos abrir mão de apego à ilusão, estaremos livres da dor, das expectativas, das esperanças e dos medos."

(Khandro Rinpoche - Compaixão para uma vida melhor - Revista Sophia, Ano 15, nª 70 - p. 9)
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quinta-feira, 30 de dezembro de 2021

A FUNÇÃO DO RELACIONAMENTO

"O relacionamento é inevitavelmente doloroso, o que é mostrado na nossa existência cotidiana. Se no relacionamento não houver tensão, ele deixa de ser um relacionamento e se torna apenas um confortável estado de latência, um entorpecente - o que a maioria das pessoas quer e prefere. O conflito se dá entre esse desejo de conforto e o factual, entre a ilusão e a realidade. Se você reconhece a ilusão, então pode, colocando-a de lado, dar sua atenção ao entendimento do relacionamento. Mas se busca segurança no relacionamento, ele se torna um investimento no conforto, na ilusão - e a grandeza do relacionamento é sua própria insegurança. Se sua busca for por segurança no relacionamento, você está impedindo sua função, que é provocar suas próprias ações e infortúnios peculiares. 

Certamente, a função do relacionamento é revelar o estado de bem-estar da pessoa. O relacionamento é um processo de autorrevelação, de autoconhecimento. Essa autorrevelação é dolorosa e exige constante ajustamento, flexibilidade do pensamento e da emoção. É uma luta dolorosa, com períodos de paz iluminada. 

Mas a maioria de nós evita ou põe de lado a tensão no relacionamento, preferindo a calma e o conforto da dependência satisfatória, uma segurança não desafiada, um porto seguro. Então, a família e outros relacionamentos tornam-se um refúgio, o refúgio do imprudente.

Quando a insegurança desliza para a dependência, como inevitavelmente acontece, então esse relacionamento particular é posto de lado e um novo é assumido na esperança de encontrar uma segurança duradoura, Mas não há segurança no relacionamento, e a dependência só gera medo. Sem entender o processo da segurança e do medo, o relacionamento se transforma em um estorvo compulsório, e uma forma de ignorância. Então, toda a existência passa a ser luta e sofrimento, e não há saída para isso exceto no pensamento correto, que surge por meio do autoconhecimento."

(Krishnamurti - O Livro da Vida - Ed. Planeta do Brasil Ltda., São Paulo, 2016 - p. 93/94)


quinta-feira, 18 de novembro de 2021

A ENTREGA A DEUS (1ª PARTE)

"A pessoa madura é consciente de que deve assumir a responsabilidade por construir a sua vida, sem sonhar e esperar que seus problemas sejam resolvidos por uma fonte externa. No entanto, um dos pilares da vida espiritual é a entrega a Deus. Será que estamos diante de mais um paradoxo da vida oculta? Esse não é o caso. As duas proposições são verdadeiras concomitantemente, pois Deus não é uma fonte externa, mas sim o âmago de nossa natureza interior. Na verdade somos uma expressão de Cristo, somos o Filho de Deus, mas a maior parte da humanidade ainda não tem consciência desta verdade profunda e eterna. 

Nosso progresso na Senda espiritual torna-se acelerado quando fazemos uma sincera entrega a Deus ou, como alguns estudiosos preferem dizer, uma entrega à nossa natureza divina. Com isso transferimos o centro de decisões de nossa vida, do ego, com suas limitações de todos os tipos, para nossa natureza superior, com seu amor, sabedoria e total comprometimento com nossa felicidade última. Com isso estaremos desativando o atual agente controlador de nossa vida, que não busca o nosso verdadeiro interesse, e entregando o controle para nosso Pai/Mãe Celestial, cujo propósito é a nossa libertação do sofrimento e Iluminação, ou seja, o nosso 'passaporte' para que, como filhos pródigos que somos, possamos retornar par a Casa do Pai.

Quando realmente nos entregamos a Deus sentimos que não estamos mais sozinhos. Passamos a ter acesso a toda a sabedoria e poder que SERÃO NECESSÁRIOS para superarmos as dificuldades e os desafios que todo aspirante enfrenta no caminho que leva à Verdade que nos liberta. Vista sob outro ângulo, a entrega a Deus acelera nosso progresso na Senda, justamente porque o objetivo da vida espiritual é alcançar a consciência da unidade com Deus. 

Sabemos, por experiência própria, que tudo conspira contra as mudanças necessárias na vida espiritual. As tentações vivem nos fazendo tropeçar. Os apegos dificultam nosso progresso. O ego usa de mil artimanhas para garantir a manutenção do status-quo, sendo uma das mais importantes, no mundo cristão, a crença errônea de que somos 'vis pecadores'. Essas dificuldades afetam buscadores novatos e avançados indistintamente, como indica a famosa passagem do Apóstolo Paulo:

'Eu sei que o bem não mora em mim, isto é, na minha carne. Pois o querer o bem está ao meu alcance; não, porém, o praticá-lo. Com efeito, não faço o bem que eu quero, mas pratico o mal que não quero. Ora, se eu faço o que não quero, já não sou eu que estou agindo, e sim o pecado (o ego) que habita em mim'.

Esse impasse também foi aludido por Jesus no Sermão da Montanha quando ele declarou: 'Ninguém pode servir a dois Senhores'. Temos que decidir se queremos tomar o caminho que nos levará às alturas espirituais ou permanecer nos vales sombrios deste mundo de ilusões, sofrendo sob o jugo do ego. Neste caso permaneceremos sujeitos às inesperadas virados do destino com suas amargas surpresas e desilusões. Nossas experiências são equiparadas a sonhos. Esses sonhos são de nossa criação. Como eles são a nossa percepção errônea da realidade, podemos mudá-los a qualquer momento. Temos o poder de criar o inferno e o poder de criar o céu. Por que não usar a nossa mente, nossa imaginação, nossas emoções e nossa determinação para criar o céu? Com isso passamos a perceber a paz, o amor e a alegria à nossa volta em tudo e em todos.(...)" ...continua.

(Raul Branco - A Essência da Vida Espiritual - Ed. Teosófica, Brasília, 2018 - p. 99/101)


quinta-feira, 21 de outubro de 2021

A INVESTIGAÇÃO POR PRAZER - VI

"A indolência é, de fato, a maldição do homem. Assim como o lavrador irlandês e o cigano cosmopolita vivem na pobreza e na miséria por causa de sua completa ociosidade, do mesmo modo o homem do mundo vive contente pela mesma razão, no meio dos prazeres sensuais. Beber vinhos delicados, comer manjares esquisitos, o amor de cores e de sons brilhantes, de formosas mulheres e de magníficos objetos em seu redor, tudo isto, para o homem cultivado, nem tem mais importância nem é mais satisfatório como motivo final de gozo, do que são as grosserias, diversões e prazeres do moço da lavoura, para o homem não cultivado.

Não pode existir o ponto final, porque a vida em cada uma de suas formas é só uma vasta série de delicadas graduações e o homem que decide permanecer imóvel no ponto de cultura que alcançou e confessa que não pode ir mais longe, faz simplesmente uma arbitrária afirmação para desculpar sua indolência. 

Existe, sem dúvida, a possibilidade de declarar que o cigano vive contente no meio da sua pobreza e a sujidade e que, portanto, é tão grande homem como o mais perfeitamente cultivado. Para ele unicamente é assim enquanto permanece na ignorância; no momento em que a luz penetra na obscura inteligência, o homem se volta a ela inteiramente. Assim acontece na mais elevada plataforma, porém a dificuldade de penetrar na mente, de admitir a luz, é muito maior. O lavrador irlandês ama sua aguardente e, enquanto possa tê-la, para nada se preocupar das grandes leis de moralidade e de religião, que se supõe governam e humanidade e induzem os homens a viver com temperança. O gastrônomo culto se ocupa unicamente de sabores sutis e de esquisitos perfumes; porém, estão tão cego com o simples rústico a respeito do fato de que existe algo mais além de semelhantes gratificações. A maneira do lavrador, permanece enganado por um espelhismo que oprime sua alma e imagina que, uma vez obtido um prazer sensual no qual se deleita, pode obter a satisfação suprema, graças a uma interminável repetição, com o que, por fim é presa por demência. O bouquet de vinho que o deleita, penetra em sua alma e a envenena, não lhe deixa outros pensamentos além dos sensuais e se encontra na mesma situação desesperada do homem que morre louco devido a embriaguez. Que benefício obteve o bebedor, da sua demência? Nenhum; a dor devorou, por fim, completamente o prazer e a morte avança para terminar a agonia. O homem sofre o castigo final por sua persistente ignorância de uma lei da natureza, tão inexorável como aquela da gravitação; uma lei que proíbe ao homem permanecer imóvel. Nem sequer duas vezes a mesma taça de prazer se pode saborear; a segunda vez deve conter ou um grão de veneno ou uma gota do elixir da vida. 

O mesmo argumento conserva sua força quanto aos prazeres intelectuais; a mesma lei opera. Vemos homens que, quanto à inteligência, são a flor da sua época, que vão muito mais longe que seus irmãos, que a maneira de torres sobressaem entre eles, são arrastados enfim pela roda fatal, girar sobre a mesma, à maneira de manivelas, cedendo à indolência inata da alma e começando a se engar a si mesmos com a quimera da repetição. Então vem a debilidade e a falta de vida, aquele estado infeliz e enganoso no qual, com demasiada frequência, grandes homens entram, justamente quando a metade da sua vida transcorreu. O fogo da juventude, o vigor da inteligência jovem, vence a inércia interna e faz que o homem escale alturas de pensamentos e encha seus pulmões mentais com o ar livre das montanhas. Mas então, afinal, a reação física dele se apodera; o mecanismo físico do cérebro perde seus ímpetos poderosos e começam seus esforços a se debilitarem, simplesmente porque a juventude do corpo tem um fim. Então é o homem assaltado pelo grande tentador da raça, que sempre em vigia permanece junto à escada da vida, pronto a lançar-se sobre aqueles que a tais alturas chegam. Verte a envenenada gota em seu ouvido e desde aquele momento a consciência toda se converte em estupidez e fica o homem aterrorizado, receando que para ele a vida vai perdendo suas possibilidades. Lança-se então atrás, a um campo de experiência familiar e ali encontra alívio tocando a bem conhecida corda da paixão ou emoção. E muitos, por desgraça, tendo feito isto, dilatam assustados ao lançar-se ao desconhecido e se contentam com fazer soar continuamente aquela corda que com mais facilidade responde. Graças a isto, conservam a certeza de que a vida ainda arde no seu interior. Mas, por fim, seu destino é o mesmo do gastrônomo e do bebedor. O poder do feitiço vai sendo menor de dia para dia, à medida que o mecanismo sensitivo vai perdendo sua vitalidade, e pretende o homem ressuscitar o fervor e excitação antigos, fazendo com mais violência soar a nota, abraçando-se mais estreitamente àquilo que lhe faz sentir, esgotando até o fel a taça envenenada. Então está perdido: a loucura se apodera da sua alma, do mesmo modo que faz presa do corpo do borracho. A vida não tem já, para ele, significação alguma e ferozmente se lança nos abismo da demência intelectual. O menos importante dos homens que cometa esta grande loucura, arrasta os espíritos dos demais por uma triste adesão a um familiar pensamento, por um abraço persistente à roda do moinho que afirma ele ser o objetivo final. A nuvem que o rodeia é tão fatal como a própria morte e os homens que uma vez se prostraram a seus pés, se afastam dele pesarosos e têm que olhar atrás, ter presentes suas primitivas palavras se querem recordar sua grandeza." 

(Mabel Collins - Pelas Portas de Ouro - Ed. Pensamento, São Paulo - p. 25/27)   


terça-feira, 19 de outubro de 2021

A INVESTIGAÇÃO POR PRAZER - V

"Quando parece que o fim foi alcançado, o desígnio logrado e que o homem não tem já nada mais que fazer, então justamente, quando parece que o melhor para ele é comer, beber e viver à larga como as bestas e sumido no mortal ceticismo, então, de fato, se olhar quisesse tão só, as Portas de Ouro que ante ele estão. Com a cultura do século em seu interior e tendo perfeitamente assimilado que ele é uma encarnação da mesma, então está em disposição de intentar o grande passo que, apesar de ser absolutamente possível, é intentado por tão poucos, mesmo entre aqueles que podem fazê-lo. É intentado tão raras vezes, em parte devido às profundas dificuldades que o rodeiam, mas muito mais influi no mesmo, não se convencer o homem de que esta é a direção, na atualidade, na qual a satisfação e o prazer têm que ser obtidos. 

Cada indivíduo se sente atraído por certos prazeres; cada um dos homens conhece que numa ou noutra espécie de sensação encontra suas maiores delícias. E, naturalmente, durante sua vida, a ela de um modo sistemático se dirige, não de outra maneira, o girassol na direção do sol se volta e o lírio sobre a água se inclina. Porém, está lutando continuamente com o fato terrível que oprime sua alma, ou seja que tão depressa como obteve seu prazer, o perde, e uma vez mais tem que andar em sua busca. Mais do que isto jamais na atualidade alcança, porque no momento final lhe escapa. Acontece-lhe isto, porque procura colher o que é impalpável a satisfazer a sede da sua alma com a sensação, por intermédio do contato dos objetos externos. Como pode o que é exterior satisfazer, ou tão somente agradar, ao homem interno, que é o que reina no interior e que não tem olhos para a matéria, nem mãos para tocar os objetos, nem sentidos com os quais se informar do que fora das suas mágicas paredes existe? Aqueles encantadas barreiras que o rodeiam carecem de limites, porque está em todas as partes; deve ser descoberto em todas as coisas viventes e não se pode conceber sem ele nenhuma parte do universo, se este é considerado como um todo coerente. Se desde o começo não se concede o anterior, é completamente inútil considerar a questão da vida. Na verdade, a vida precisa de significação, a menos de ser universal e coerente e a menos que sustenhamos nossa existência devido ao fato de que somos uma parte daquilo que é; não pela razão da nossa própria existência.    

Este é um dos mais importantes fatores do desenvolvimento do homem, o reconhecer o profundo e completo reconhecimento da lei de universal unidade e coerência. A separação existe entre os indivíduos, entre os mundos, entre os diverso polos do universo e da fantasia mental e física chamado espaço, é um pesadelo da imaginação humana. Que os pesadelos existem e que existem só para atormentar, não há criança que não o saiba e o que necessitamos é a faculdade de distinguir entre a fantasmagoria do cérebro que a nós unicamente concerne e a fantasmagoria da vida diária, na qual outros também estão interessados. Esta regra se aplica também ao caso mais amplo. A ninguém importa mais que a nós mesmos que vivamos no meio de um pesadelo de horror ilusório e que nos imaginemos sós no universo e capazes de ação independente, durante tão longo tempo, como nossos associados são só aqueles que constituem uma parte do sonho. Mas quando desejamos falar com aqueles que chegaram às Portas de ouro e, empurrando-as, as abriram, é então inteiramente necessário, de fato é essencial, distinguir e não levar à nossa vida as confusões do nosso sonho. Se isto fazemos, somos considerados loucos e nos aprofundamos nas trevas onde não existe outro amigo que o caos. Este caos tem vindo em continuação de cada um dos esforços do homem que a história registra; depois que a civilização reinou, a flor cai e morre, o inverno e a obscuridade a destroem. Enquanto o homem recusa fazer o esforço de distinção que lhe permitiria distinguir entre as formas noturnas e as ativas figuras do dia, deve isto acontecer inevitavelmente. 

Mas se o homem tem coragem para resistir a esta tendência reacionária e permanecendo firme na altura à qual chegou, adiante seu pé para dar outro passo, porque não há de poder encontrar o que busca? Nada existe que nos dê motivos para supor que a senda termina em um certo ponto, exceto a tradição que assim o tem dito e que os homens tem aceitado e abraçado como uma justificação para sua indolência."

(Mabel Collins - Pelas Portas de Ouro - Ed. Pensamento, São Paulo - p. 22/24)  


quinta-feira, 14 de outubro de 2021

A INVESTIGAÇÃO POR PRAZER - IV

"O que os homens desejam é saber como mudar a dor pelo prazer; ou, por outras palavras, encontrar por meio de que procedimento pode regular-se a consciência, com o fim de que a sensação mais agradável, seja e que se experimente. Se é possível descobrir-se isto para o esforço do pensamento humano, é pelo menos uma questão digna de se ter em conta.

Se a mente do homem permanece fixa sobre algum assunto determinado com a concentração suficiente, obtém a iluminação com relação ao mesmo, mais cedo ou mais tarde. O indivíduo em quem a iluminação final aparece, é chamado um gênio, um inventor, um inspirado. Porém, ele é unicamente a síntese de uma grande obra mental verificada em seu redor por homens desconhecidos, dos quais alguns estão separados dele por grandes distâncias; sem ele houvera carecido de material necessário para sua empresa. Do mesmo modo o poeta precisa o alimento de inumeráveis poetastros.

Ele é a essência do poder poético do seu tempo e dos tempos anteriores a ele. É impossível separar um indivíduo de qualquer espécie, dos seus congêneres. 

Portanto, se em vez de aceitar o desconhecido como incognoscível, os homens, de comum acordo, a ele dirigissem seus pensamentos, estas Portas de Ouro não permaneceriam tão inexoravelmente fechadas. Só se necessita de uma mão forte para empurrá-las e abri-las. A coragem para entrar nelas é a mesma que se necessita para penetrar no mais secreto da nossa própria natureza, sem medo nem vacilação. Na mais delicada porção, a essência, o perfume dos homens, se encontra a chave com a qual estas grandes portas se abrem. E uma vez abertas, o que é que ali se encontra? Vozes existem aqui e ali, que, no meio do grande silêncio dos séculos, a esta pergunta respondem; todos os que por elas passaram têm deixado atrás de si palavras à maneira de legados para os que são como eles. Nestas palavras podemos encontrar definidas algumas indicações referentes daquilo que se vê mais além das portas. Porém, unicamente aqueles que desejam empreender este caminho podem ser o significado oculto que por trás das palavras se escondem. Os sábios, ou melhor, os comentadores, leem os livros sagrados de diferentes nações, os de poesia e de filosofia, devido a encumeadas inteligências e neles unicamente encontram mero materialismo. A imaginação, glorificando as legendas da natureza, ou exagerando as possibilidades físicas do homem, lhes explica tudo quanto eles encontram na bíblia da humanidade. 

Tudo quanto existe nas palavras destes livros, existe em cada um de nós e é impossível encontrar, tanto na literatura, como em qualquer das direções em que a inteligência se lance, o que não existe no homem que estuda. Isto é, sem dúvida, um feito evidente conhecido por todos os verdadeiros estudantes. Mas tem que ser especialmente recordado, com referência a este assunto obscuro e profundo, desde o momento em que com tanta facilidade acreditam os homens que nada para os demais pode existir, ali onde encontram eles o vazio unicamente. 

Uma coisa logo percebe o homem que lê. Todos os que se adiantarem, não têm achado que as Portas de Ouro conduzam ao esquecimento. Ao contrário, logo que o limiar das mesmas se cruzou, pela primeira vez, a sensação é real. Mas pertence a uma nova ordem, a uma ordem desconhecida para nós na atualidade e que não podemos apreciar sem que, pelo menos, possuamos alguma indicação a respeito do seu caráter. Esta indicação pode indubitavelmente ser obtida por qualquer estudante que se familiarize com toda a literatura que para nós é acessível. Os livros e manuscritos místicos existem, mas permanecem inacessíveis, simplesmente porque não existe homem algum em disposição de ler a primeira página de qualquer deles, que não se convença como aqueles que têm estudado o assunto suficientemente. Deve existir uma linha contínua através destes conhecimentos; vemos nós passar da mais densa ignorância à sabedoria; é natural, unicamente, que possamos obter o conhecimento intuitivo e a inspiração. Possuímos alguns raros fragmentos destes grandes dons do homem; onde, pois, está o todo do qual devem eles constituir uma parte? Escondido atrás do sutil e, ao parecer, infranqueável véu, que o oculta de nós, como oculta toda a ciência, toda arte, todos os poderes do homem, até que este tem a coragem suficiente para rasgá-lo. Esta coragem procede  unicamente da convicção. Uma vez que um homem crê que aquilo que deseja existe, tratará de obtê-lo a todo custo. A dificuldade neste caso estriba-se na incredulidade do homem. É necessário muito tempo e grande concentração do pensamento, para se poder lançar na direção da região desconhecida da natureza do homem, com o objeto de que as portas se possam abrir e ser suas gloriosas perspectivas exploradas.

Que merece a pena fazer-se isto, aconteça o que acontecer, tudo deve conduzi-lo a crer ao que fez a triste pergunta do século corrente... É a vida digna de ser vivida? Certamente é o suficiente para incitar o homem a um novo esforço, a suspeita de que mais além da civilização, mais além da cultura mental, mais além da arte e da perfeição mecânica, existe alguma coisa de novo, outro vestíbulo que nos admite às realidades da vida." 

(Mabel Collins - Pelas Portas de Ouro - Ed. Pensamento, São Paulo - p. 19/22


terça-feira, 12 de outubro de 2021

A INVESTIGAÇÃO POR PRAZER - III

"Esta pergunta, filha da tristeza e do aborrecimento, que nos parecem constituir uma parte essencial do espírito do século em que vivemos é de fato, uma questão que deve ter sido tratada em todas as épocas. Se com a inteligência nos dirigimos para trás, através da história, sem dúvida encontraremos que tem sido feita sempre quando a flor da civilização se tinha aberto completamente e quando suas pétalas com dificuldade se mantinham unidas. A porção natural do homem tem alcançado então sua maior altura; tem levado rodando a pedra até o cimo do monte da dificuldade, só para contemplá-la a rodar novamente para baixo, logo que tem alcançado o cume, como no Egito, em Roma, na Grécia. Porque este trabalho inútil? Não é suficiente para produzir um desalento e um mal-estar impossíveis de descrever, estar levando a cabo um trabalho, só para vê-lo destruído? Depois de tudo, isto é o que o homem tem feito através de toda a história, o mais longe que nossos limitados conhecimentos podem alcançar? Um cimo existe ao qual chega por meio de imensos e coletivos esforços, e no qual resplandece a mais brilhante florescência de todas as qualidades intelectuais, mentais e materiais de sua natureza. O cúmulo da perfeição sensual é alcançado. E então sua energia se debilita, seu poder diminui e desce através do desalento e da saciedade até a grosseria. Porque não permanece no cume da montanha à qual chegou e olhando os longínquos montes não resolve escalar suas maiores alturas? Porque é ignorante e vendo um grande resplendor à distância, baixa os olhos deslumbrados, e volta atrás para continuar na sombria encosta da sua montanha familiar. Todavia, existiu e existe alguém suficientemente decidido para olhar, sem baixar os olhos e para decifrar alguma coisa de que nele mesmo oculta. Poetas e filósofos, pensadores e mestres, todos aqueles que são os 'irmãos maiores da raça'; têm gozado desta vista de tempos a tempos e alguns deles têm reconhecido, no resplendor confuso, o contorno das Portas de Ouro.

Estas portas nos admitem ao santuário da mesma natureza do homem, ao lugar de onde sua vida-poder procede e onde ele é sacerdote do santuário da vida. Que é possível entrar, que é possível passar através destas portas um ou dois, nos têm demonstrado. Platão, Shakespeare e uns poucos mais de fortes, têm passado por elas e em enigmática linguagem nos têm falado das proximidades das mesmas. Quando o homem forte cruzou o limiar, já não se diz nada mais aos que do outro lado permanecem. E até as palavras que pronuncia, quando ainda por elas não passou, estão cheias de mistério, que unicamente os que seguem seus passos podem ver brilhar a luz nas mesmas."   

(Mabel Collins - Pelas Portas de Ouro - Ed. Pensamento, São Paulo - p. 18/19)


quinta-feira, 7 de outubro de 2021

A INVESTIGAÇÃO POR PRAZER - II

"É indubitável que muitos mais que aqueles que o fazem, o recorreriam ao suicídio com o fim de se livrar do fardo da vida, se pudessem convencer-se que daquele modo se pode lograr o olvido. Porém, aquele que duvida antes de esgotar o veneno, por ter medo de mudar unicamente de modo de existência e de se encontrar o sujeito a uma forma talvez mais ativa de miséria, é um homem de mais conhecimento que as almas temerárias que, de um modo selvagem, se atiram no seio do desconhecido, esperando seus favores. As águas do esquecimento são um tanto completamente diferentes das águas da morte e a raça humana não pode se extinguir pela morte, enquanto a lei do nascimento acione. O homem volta à vida física, do mesmo modo que o bebedor volta ao frasco de vinho; ele não sabe porque, sabe unicamente que deseja a sensação produzida pela vida, como o bebedor deseja a sensação pelo vinho originada. As verdadeiras águas do esquecimento existem longe, atrás da nossa consciência, e podem unicamente ser alcançadas, deixando de existir naquela consciência, fazendo cessar o exercício da vontade, que nos enche de sentidos e de sensibilidade.

Porque não volta a criatura-homem àquela grande e silenciosa matriz, da qual veio e permanece nela em paz, como o menino não nascido que goza da mesma antes que os impulsos da vida o tenham alcançado? Não o faz porque sua sede pelo prazer e a dor, pela alegria e a tristeza, pelo amor e a cólera lhe impedem. O homem desgraçado susterá que não tem o menor apego à vida; e, apesar disso, prova a falsidade das suas palavras, vivendo. Ninguém o obriga a viver; o galeote pode permanecer encadeado ao seu remo, porém sua vida não pode ser encadeada ao seu corpo. O soberbo mecanismo do corpo humano é tão inútil como uma máquina cujos fogos estão apagados, se a vontade de viver cessa; vontade que mantemos firme e continuadamente e que nos conduz às coisas, que, de outro modo, verificá-las nos encheriam de desalento, como, por exemplo, o momento da inspiração e da expiração. Esforços hercúleos, tais como estes, suportarmos sem lamentações e, na verdade, com prazer, com tanto que possamos existir no meio de sensações inúmeras.

E mais ainda: a maior parte de nós, nos contentamos com ir para diante sem objetivo, sem desígnio, sem a menor ideia de um motivo, sem compreender que caminho é que estamos investigando. Quando, pela primeira vez, o homem reconhece esta falta absoluta de objetivo e se convence profundamente de que está trabalhando com grandes e constantes esforços e sem nenhuma ideia a respeito do fim, na direção do qual sem esforço se dirige, então desce sobre ele a miséria do século dezenove, a miséria intelectual. Encontra-se perdido, desencaminhado e para ele não há esperança. Converte-se em cético, a desilusão e o aborrecimento apoderam-se dele e faz a pergunta em aparência incontestável: se, depois de tudo, merece a pena se tomar o trabalho de respirar, perante tais resultados desconhecidos e incognoscíveis, ao parecer. Porém, são incognoscíveis semelhantes resultados? Pelo menos, para perguntar algo de menor importância, é impossível fazer uma conjetura a respeito da direção na qual nosso fim existe?"

(Mabel Collins - Pelas Portas de Ouro - Ed. Pensamento, São Paulo - p. 16/18)


terça-feira, 5 de outubro de 2021

A INVESTIGAÇÃO POR PRAZER - I

"Todos conhecemos aquele algo misterioso e severo, ao qual chamamos miséria, que ao homem persegue e de um modo bastante estranho, como a primeira vista parece; não o persegue vaga e incertamente, mas com pertinácia positiva e inquebrantável. Sua presença não é absolutamente contínua, pois de outro modo deixaria o homem de viver; porém sua pertinácia não cessa de modo algum. O sombrio fantasma da desesperação permanece por trás do homem, pronto para tocá-lo com seu dedo terrível, tão depressa como se tivesse sido demasiado tempo feliz. Quem deu a este horrível espectro o direito de vagar ao nosso redor desde que nascemos até que morremos? Quem lhe deu o direito de permanecer sempre à nossa porta, conservando-a entreaberta com sua mão invisível, mas não obstante horrível, pronta a entrar no momento oportuno? O maior filósofo de todos os que viveram sucumbe, afinal ante o mesmo; e unicamente é filósofo, no verdadeiro sentido da palavra, aquele que reconhece o fato de que é irresistível e sabe que, como todos os demais homens, deve sofrer cedo ou tarde. A dor e a miséria constituem uma parte da herança dos homens e aquele que julga que nada poderá fazê-lo sofrer, o que faz é revestir-se de um egoísmo frio e profundo. Esta vestidura poderá protegê-lo contra a dor; mas também o separará do prazer. Se a paz pode ser encontrada sobre a terra, ou alguma alegria existe na vida, não pode ser fechando as portas do sentimento, que nos admitem a porção mais elevada e mais vivida da nossa existência. A sensação, tal como a obtemos por intermédio do corpo físico nos proporciona tudo aquilo que nos induz a viver daquela forma. É inconcebível que nenhum homem se quisesse dar ao trabalho de respirar, a não ser que o ato levasse consigo um sentimento de satisfação. O mesmo acontece com relação a cada uma das ações em todos os instantes da nossa vida: vivemos porque até na mesma sensação da dor existe o prazer. Sensação é o que nós desejamos. De outro modo experimentaríamos de comum acordo as águas profundas do esquecimento e extinguir-se-ia a raça humana. Se isto acontece com a vida física, o mesmo se realiza com a vida das emoções, a imaginação, a sensibilidade, com todas aquelas esquisitas e delicadas formações que, com o maravilhoso mecanismo registrador do cérebro, constituem o sutil homem interno. Para eles o prazer reside na sensação; e uma série infinita de sensações, é para eles a vida. Destrua-se a sensação que faz que desejem perseverar na experiência da vida e nada se terá adiantado. Por esta razão, o homem que intenta obliterar a sensação da dor e que se propõe manter-se no mesmo estado, quando sofre como quando goza, fere a raiz da vida mesmo e destrói o objeto da sua própria existência. Deve-se aplicar isto o mais completamente que nossos poderes atuais, raciocinadores e intuitivos, nos permitam, em cada estado, até naquele do Nirvana ensinado pelos Orientais. Esta condição pode ser unicamente uma, dotada de sensações infinitamente mais sutis e esquisitas, se é, depois de tudo, um estado e não aniquilação: e em harmonia com a experiência da vida, da qual somos, na atualidade capazes de julgar, aumento na sutileza da sensação significa vitalidade acrescentada; como, por exemplo, um homem sensível e de imaginação, sente mais por causa da infidelidade ou fidelidade de um amigo, do que um homem da mais grosseira natureza física, por meio dos sentidos. Claro é, portanto, que o filósofo que recusa sentir, não se reserva lugar algum de refúgio; nem sequer o distante e inacessível Nirvana. Pode unicamente negar-se a si mesmo sua herança de vida, que é, em outras palavras, o direito de sensação. Se prefere sacrificar tudo aquilo que faz dele um homem, deve-se contentar com uma mera indolência de consciência, o que é uma condição que, comparada à vida da ostra, é esta uma vida ativa.

Porém, nenhum homem é capaz de efetuar tal fato. Sua existência continuada prova plenamente que ele ainda deseja sensação, e a deseja tão positiva e ativamente, que o desejo deve ser concedido na vida física. Seria mais prático não se enganar a si mesmo com a falsidade do estoicismo, não tentar renunciar aquilo do qual nada o induza separar-se. Não seria um conduta muito mais intrépida, um modo de resolver o grande enigma da existência, abraçar-se a ele, retê-lo com firmeza, e perguntar-lhe o mistério de si mesmo? Se os homens quisessem tão só deter-se e considerar as lições que o prazer e a dor lhes ensinaram, muito se poderia conjeturar daquela coisa estranha que causa estes efeitos. Mas os homens se apressam em se afastar de tudo quanto os possa conduzir ao estudo de si mesmos ou de qualquer minuciosa análise da natureza humana. Apesar de tudo, deve existir uma ciência de vida tão inteligível como qualquer dos métodos que nas escolas se empregam; a ciência é desconhecida, é verdadeira e sua existência é meramente suspeitada por um ou dois de nossos mais avançados pensadores. O desenvolvimento de uma ciência é unicamente o descobrimento daquilo que já existe; e tão mágica e inacreditável é na atualidade, a química para o moço lavrador, como é a ciência da vida para o homem de ordinárias percepções. Apesar de tudo, pode e deve existir um iluminado que perceba o crescimento da nova ciência, do mesmo modo que os primeiros e torpes experimentadores nos trabalhos de laboratório, veem o sistema dos conhecimentos na atualidade obtidos, desenvolvendo-se por si mesmos do seio da natureza, para o uso e benefício do homem."  

(Mabel Collins - Pelas Portas de Ouro - Ed. Pensamento, São Paulo - p. 13/16)


quinta-feira, 26 de agosto de 2021

O CONSELHO GERAL

"'Viva neste mundo como um convidado. O seu verdadeiro mundo não é aqui. A escritura da casa em que você vive talvez leve o seu nome, mas a quem ela pertenceu antes de você a adquirir? E de quem ela será depois que você morrer? A casa é apenas uma hospedaria à beira da estrada, uma parada na longa estrada que leva até o seu lar em Deus.

'Portanto, pense em você mesmo como um convidado na Terra. Evidentemente, enquanto estiver aqui, tente ser um bom convidado. Comporte-se da melhor maneira possível. Seja responsável. Zele pelas coisas que Deus lhe deu; entretanto, nem por um momento se esqueça de que essas coisas pertencem a Ele, não a você.

'Como as pessoas são tolas dedicando o seu tempo a cuidar do corpo, a entesourar riquezas, a acumular mais bens! Quando a morte as arrebatar, elas não haverão de deixar coisa nenhuma. 

'As pessoas dão desculpas constantemente. 'Não tenho tempo para meditar', elas dizem. 'Tenho de cumprir os meus compromissos.' Bem, quando Deus as chamar, elas terão de faltar com todos os seus compromissos! A morte é um 'compromisso' que elas não podem cancelar.

'Por que perder tanto tempo com coisas efêmeras? Ó cegos: despertai!

'De um lugar além dos pequenos prazeres da vida, Deus chama você. Ele assim o faz estando além da dor, irmã gêmea do prazer. 'Procure-me', Ele diz. 'Descubra em mim a alegria eterna que você tem procurado durante tanto tempo nas ondas das mudanças. Tudo o que você esperou durante encarnações seguidas você haverá de encontrar para sempre apenas em Mim.'"

(Paramhansa Yogananda - A Essência da Autorrealização - Ed. Pensamento-Cultrix, 2010, p. 178/179)